FUGIR
DA DOR: UM PROCESSO QUE CAUSA AINDA MAIS DOR
Nós, seres humanos, guardamos vários tipos de sentimentos
desconfortáveis que ficam acumulados no nosso inconsciente. Mesmo quando
estamos atravessando uma ótima fase, por mais que pareça estamos felizes, lá
dentro de nós, existem medos e sentimentos ocultos que ficam temporariamente
adormecidos: medo de envelhecer, medo de perder alguém, preocupação com os
filhos, medo de perder o emprego, preocupações com uma causa na justiça... Além
disso temos aqueles sentimentos guardados do passado: uma mágoa de alguém, um
culpa por ter feito algo, alguma rejeição sofrida na infância, a tristeza de
uma perda e muitos outros sentimentos.
Guardamos uma nuvem de negatividade latente dentro de nós. Os
animais na natureza não produzem essa negatividade e por isso estão muito mais
paz e conectados com a vida do que os humanos.
Para que possamos sobreviver no dia a dia, desenvolvemos um
mecanismo de ocultar os sentimentos, reprimi-los, não senti-los. É a maneira
com a qual lidamos com essas coisas tão incômodas que guardamos. Imagine se
durante o seu dia viesse a tona todos os seus pensamentos e sentimentos de medo
e outras emoções negativas que você guarda? Para que isso não ocorra damos um
jeito de não entrar em contato direto com essa negatividade.
Entretanto, mesmo não entrando em contato direto com ela, a
negatividade está lá dentro de nós, guardadinha, nos causando mal estar. Aquilo
que chamamos comumente de "ansiedade" é o sintoma dessa nuvem
negativa acumulada dentro de nós. Podemos dizer então que a ansiedade é o acumulo
reprimido dessas emoções desagradáveis que não queremos sentir.
Então, a nossa tentativa esquecer ou de não sentir é apenas uma
ilusão. Se está lá dentro guardado, mesmo que você nunca pense ou fale sobre
aquilo, esta energia provocará sofrimento de qualquer maneira.
Imagine então uma pessoa que se sentiu rejeitada pelo término de
um relacionamento. O sofrimento é intenso no início. Temos que entrar em
contato com aquilo em algum nível. Quanto mais profundamente sentirmos toda
aquela emoção ruim, mais rapidamente ela será dissolvida. Mas damos sempre um
jeitinho de não entrar em contato 100% para evitar aquele sofrimento maior
inicial. Um pedaço daquela rejeição é varrido para os bastidores do nosso
inconsciente e soma com outros sentimentos que também foram parar lá. E as
vezes ficam por ali por 60 anos, ou até o dia da nossa morte.
Usamos vários métodos para não sentir as emoções. Podemos fingir
que não estamos sentindo tanto assim e convencer os outros e a nós mesmos que
estamos bem, quando na verdade não estamos. A maioria de nós faz isso em algum
momento, em alguma profundidade.
Outra forma de não sentir é ir buscar um prazer imediato para
anestesiar temporariamente o incômodo: comer uma coisa bem gostosa, fumar,
beber, se drogar, fazer sexo, ocupar a mente com algum vício qualquer
(trabalhar em excesso, jogar, comprar, ver televisão...). Tudo isso nos faz
sentir melhor, mas apenas de forma temporária. Aquilo que está lá dentro não
foi devidamente tratado e vai continuar a nos perturbar causando mais
ansiedade. Aí entramos em um círculo vicioso lançando mão novamente dos
mecanismos de fuga.
Esse processo de fuga acontece as vezes de forma
"inocente" sem que a gente perceba. Estamos em casa e aí dá uma
vontade de comer alguma coisa. Se pararmos para analisar, muitas vezes não é
fome, nosso corpo não está precisando de alimento naquele momento. É que surgiu
um desconforto, uma inquietação. São as dores guardadas que não entramos em
contato. E aí não olhamos para isso e ativamos imediatamente o mecanismo de
fuga, e assim surge uma vontade de comer algo para sentir prazer e anestesiar
aquela sensação ruim, pelo menos por alguns minutos. Nesse momento, talvez
tenha surgido uma sensação de solidão, medo, ou alguma culpa, enfim, pode ser
qualquer coisa, vai variar bastante de um indivíduo para o outro.
Ao tentarmos fugir da
dor, criamos cada vez mais dor. Ao não querer entrar em contato com emoções
negativas, elas crescem. É partir dessa repressão que surgem problemas cada vez
mais graves: obesidade, drogas, compulsões, ansiedade generalizada, depressão,
pânico...
De forma geral, os homens
tem mais dificuldade em se permitir sentir as emoções. A mulher se sente mais
livre para se expressar emocionalmente e assim pode se curar mais facilmente. O
mesmo ocorre na busca por trabalhos terapêuticos que lidam com a parte
emocional.
É preciso ter cuidado para entrar em contato com as emoções de
forma lúcida, observando-as para não ser sugado por elas e as alimentar. O
aprendizado de como observar de forma lúcida é muito particular, difícil de
ensinar e exige prática. Mas basicamente, inicialmente é preciso reconhecer que
toda aquela negatividade é uma nuvem de energia negativa. Não importa o quanto
possa parecer real e doloroso, é apenas uma nuvem de energia. Ao reconhecermos
isso devemos entrar corajosamente nessa nuvem, permitindo-se sentir todos as
sensações desagradáveis e pensamentos que surgem. Sinta, e observe. Esse
contato direto faz com a energia se dissolva.
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